
terça-feira, 13 de setembro de 2011
Ópera dos Vivos

terça-feira, 9 de agosto de 2011
Melancolia

quarta-feira, 20 de julho de 2011
Homofobia
segunda-feira, 18 de julho de 2011
Mais uma do PSDB de São Paulo contra os professores
sexta-feira, 15 de julho de 2011
O ensino superior está encrencado
segunda-feira, 11 de julho de 2011
Que bosta o que o Pondé escreveu hoje na Folha!!!
quinta-feira, 7 de julho de 2011
Mantenha fora do alcance de crianças
domingo, 3 de julho de 2011
Cérebro de pipoca
Gilberto Dimenstein (Folha de São Paulo, 03/07/2011)
Pesquisadores detectam há tempos distorções, como a compulsão para se manter conectado, como um vício |
O GOOGLE anunciou na semana passada um projeto para enfrentar o Facebook, disposto a reinventar a mídia social. A notícia teve óbvio impacto mundial e despertou a curiosidade sobre mais uma rodada de inovações tecnológicas, capazes de nos fazer ainda mais conectados.
No dia seguinte, porém, o Facebook reagiu e anunciou para esta semana uma novidade também de grande impacto, possivelmente em celulares. Para alguns psicólogos americanos, esse tipo de disputa produz um efeito colateral: um distúrbio já batizado de "cérebro de pipoca".
Esse distúrbio é provocado pelo movimento caótico e constante de informações, exigindo que se executem simultaneamente várias tarefas. Por causa de alterações químicas cerebrais, a vítima passa a ter dificuldade de se concentrar em apenas um assunto e de lidar com coisas simples do cotidiano, como ler um livro, conversar com alguém sem interrupção ou dirigir sem falar ao celular. É como se as pessoas tivessem dentro da cabeça a agitação do milho explodindo no óleo quente.
A falta de foco gera entre os portadores do tal "cérebro de pipoca" um novo tipo de analfabetismo: o analfabetismo emocional, ou seja, a dificuldade de ler as emoções no rosto, na postura ou na voz dos indivíduos, o que torna complicado o relacionamento interpessoal.
Sou um tanto desconfiado de notícias alarmantes provocadas pelo surgimento de novas tecnologias. Toda ruptura desencadeia uma onda de nostalgia e de temores em relação ao futuro.
Mas algumas pesquisas em torno do "cérebro de pipoca" merecem atenção por afetar o processo de aprendizagem. Uma delas foi realizada em Stanford, a universidade que, por ajudar a criar o Vale do Silício, na Califórnia, impulsionou a tecnologia da informação.
Neste ano, Clifford Nass, professor de psicologia social na Universidade Stanford, revelou num seminário sobre tecnologia da informação a pesquisa que fez com jovens que passam muitas horas por dia na internet, acostumados a tocar muitas tarefas ao mesmo tempo.
Ele mostrou fotos com diversas expressões e pediu que os jovens identificassem as emoções. Constatou a dificuldade dos entrevistados. "Relacionamento é algo que se aprende lendo as emoções dos outros", afirma Nass.
O problema, segundo ele, está tanto na falta de contato cara a cara com as pessoas como na dificuldade de manter o foco e verificar o que é relevante, percebendo sutilezas, o que exige atenção.
Os pesquisadores estão detectando há tempos uma série de distorções, como a compulsão para se manter conectado, semelhante a um vício.
Trata-se de uma inquietude permanente, provocada pela sensação de que o outro, naquele momento, está fazendo algo mais interessante do que aquilo que se está fazendo. Tome o Facebook ou qualquer outra rede social.
Chegaram a desenvolver um programa que envia para o celular da pessoa um aviso sempre que um amigo dela está se aproximando de onde ela está.
O estímulo, porém, começa no mercado de trabalho. Vemos nos anúncios de emprego uma demanda por pessoas que façam muitas coisas ao mesmo tempo.
Mas o que Nass, o professor de Stanford, entre outros pesquisadores, defende é o contrário. Quem faz muitas tarefas ao mesmo tempo, condicionando seu cérebro, fica menos funcional. Não sabe perceber as emoções e trabalhar em equipe, não sabe focar o que é relevante e tem dificuldade de estabelecer um projeto que exige um mínimo de linearidade. Não sabe, em suma, diferenciar o valor das informações.
Não deixa de ser um pouco absurdo valorizar tanto os recursos tecnológicos que aproximam as pessoas virtualmente, mas que as afastam na vida real.
Daí se entende, em parte, segundo os pesquisadores, por que, em todo o mundo, está explodindo o consumo de remédios de tarja preta para tratar males como a ansiedade e a hiperatividade.
PS- Perto da minha casa, aqui em Cambridge, há uma padaria artesanal, com mesas comunitárias, que decidiu ir contra a corrente. Seus proprietários simplesmente proibiram que se usasse celular lá dentro para diminuir a poluição sonora e a agitação. Sucesso total. O efeito colateral: ficou difícil conseguir lugar.
sexta-feira, 1 de julho de 2011
Alguns problemas do serviço público
segunda-feira, 27 de junho de 2011
As redes sociais
O Brasil mudou!!!
sábado, 25 de junho de 2011
Sobre raciocínio e discussões...
Estudo contraria ideia de que a razão se desenvolveu para achar a verdade
Teoria de cientistas franceses explicaria porque raciocínio das pessoas é cheio de inconsistências e vieses
HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA
Num artigo impactante, que vira do avesso alguns dos pressupostos da filosofia e da psicologia evolucionista, os pesquisadores franceses Hugo Mercier (Universidade da Pensilvânia) e Dan Sperber (Instituto Jean Nicod) sustentam que a razão humana evoluiu, não para aumentar nosso conhecimento, mas para nos fazer triunfar em debates.
Desde alguns gregos, mas especialmente com René Descartes (1596-1650), consolidou-se a ideia de que a razão é um instrumento pessoal para nos aproximar da verdade e tomar as melhores decisões possíveis. "Penso, logo existo" é a divisa que celebrizou o pensador francês.
Se esse esquema é exato, como explicar que o pensamento humano erre tanto? Como espécie, fracassamos nos mais elementares testes de lógica, não conseguimos compreender noções básicas de estatística e nascemos com uma série de vieses cognitivos que conspiram contra abordagens racionais.
A situação não melhora quando quando abandonamos o reino das abstrações para entrar no terreno do interesse pessoal. Vários estudos têm mostrado que a maioria das pessoas comete verdadeiros desatinos lógico-financeiros ao administrar seus fundos de pensão.
Mercier e Sperber afirmam que é possível explicar esse e outros paradoxos se deixarmos de lado a noção clássica para adotar o que chamam de teoria argumentativa. Apresentam uma convincente massa de estudos e evidências em favor de sua tese.
A ideia básica é que a capacidade de raciocinar é um fenômeno social e não individual, cujo objetivo é persuadir nossos semelhantes e fazer com que sejamos cautelosos quando outros tentam nos convencer de algo.
SOLUÇÕES
A teoria, dizem os autores, não só faz sentido evolutivo como ainda resolve uma série de problemas que há muito desafiavam a psicologia.
O mais importante deles é o chamado viés de confirmação, que pode ser definido como "buscar ou interpretar evidências de maneira parcial, para acomodar crenças, expectativas ou teorias preexistentes". O fenômeno está na base daquela mania irritante de políticos de só responder o que lhes interessa.
O viés de confirmação é ainda uma das razões de persistência no erro, mesmo quando ele nos prejudica.
Temos dificuldade para processar informações que contrariam nossas convicções. Em suas versões extremas, ele produz pseudociências, fé em religiões e sistemas políticos e também teorias da conspiração.
Sob o modelo clássico, o viés de confirmação é uma falha de raciocínio mais ou menos inexplicável.
Mas, se a razão foi selecionada para nos fazer vencer em debates, então faz sentido que eu busque apenas provas em favor da minha tese, e não contra ela.
Adotada a lógica da produção de argumentos, o que era erro se torna um dos pontos fortes da teoria.
FENÔMENO SOCIAL
O modelo tem, evidentemente, implicações fortes. A mais evidente delas é que a razão só funciona bem como fenômeno social. Se pensarmos sozinhos, vamos muito provavelmente chafurdar cada vez mais fundo em nossas próprias intuições.
Mas, se a utilizarmos no contexto de discussões, aumentam bastante as chances de, como grupo, nos dar bem. Ainda que nem sempre, por vezes as pessoas se deixam convencer por evidências.
Trabalhos mostram que, quando submetidas a situações nas quais é preciso chegar a uma resposta correta (testes matemáticos ou conceituais), pessoas atuando sozinhas se saem mal, acertando em torno de 10% das respostas (Evans, 1989).
Quando têm de solucionar os mesmos problemas em grupo, o índice de acerto vai para 80%. É o chamado efeito do bônus de assembleia.
sexta-feira, 24 de junho de 2011
190 anos de São João da Boa Vista
terça-feira, 14 de junho de 2011
Tradições e novas provocações...
A tradição socrático-platônica pressupõe a realidade divida em duas esferas. O mundo sensível, que é o mundo em que nós vivemos, é vista por Platão como uma sombra, uma cópia imperfeita do mundo das ideias. Essa narrativa pode ser encontrada no mito da caverna, exposto no livro VII da “República”.
Essa tradição separa o mundo material do mundo espiritual, entendo aqui espírito como as ideias produzidas pela mente humana. O mundo material é uma sombra porque está em constante dinâmica, movimento e transformação, nunca estável e, dessa forma, impossível de ser compreendido e conhecido enquanto conceito e verdade. Nesse mundo o que prevalece são as opiniões (doxa).
É no mundo das ideias onde se encontra a realidade, porque essa por ser verdade e, consequentemente, conforme afirmava Platão, é bela. Na alegoria da caverna Platão compara a ideia suprema do bem e do belo com a luz do Sol porque, segundo ele, essa verdade é tão superior que os humanos não possuiriam palavras e conceitos para nominá-la ou descrevê-la.
O cristianismo se apropriou do platonismo e fez uma transposição do mundo das ideias para o mundo após a morte, o mundo espiritual no sentido religioso, onde encontraria-se a vida eterna. Já o mundo material também é apropriado pelo cristianismo como um mundo transitório, agora configurado com a ideia do pecado e da culpa, inerente ao corpo.
A dicotomia entre o corpo e a alma, para o cristianismo de origem platônica, é fundamental para se entender a tradição filosófica que chega em Descartes com o argumento do cogito (“penso, logo existo”). Nessa argumentação cartesiana, exposta em livros como “O discurso do método” e “Meditações de primeira filosofia”, a mente humana, onde ocorre o pensamento, está independente do corpo. Na verdade, para Descartes, o corpo é visto como uma máquina, uma estrutura sistêmica subordinada ao pensamento e todo o processo de conhecimento passa fundamentalmente pelo cogito.
Nesse sentido, o que se encontra na maioria dos manuais de Filosofia, é a presença de uma tradição filosófica, que começa em Sócrates e Platão, passa pelo cristianismo medieval e consolida-se com Descartes no século XVII, que apresenta uma concepção imaterial do pensamento e, do ponto de vista ético, subordinando os sentidos e as emoções, como formas de apropriação do conhecimento, a racionalidade do intelecto.
Na contramão dessa tradição, encontramos o filósofo judeu de origem portuguesa, que passou a viver na Holanda para fugir das perseguições religiosas católicas na Península Ibérica e luteranas na Alemanha, no território do antigo Sacro Império Romano Germânico, chamado Baruch (Benedito) Spinoza (Espinosa).
Esse intelectual e filósofo moderno, pois viveu no século XVII, que é o mesmo século de Descartes e de Galileu, recupera uma tradição materialista que vem da antiga Grécia, de Demócrito, com sua teoria atômica, e de Epicuro, com seu hedonismo, também chamado de epicurismo.
Vale à pena recordar o que dizia Demócrito. Para ele, o mundo, que podemos hoje entender por universo, por natureza, é constituído exclusivamente de átomos. Esses átomos se juntam conforme seus tamanhos e formas, dando origem aos seres, animados e inanimados. Nesse sentido, para Demócrito, não existe vida após a morte, porque esta é simplesmente a desintegração atômica dos seres vivos.
Nessa tradição materialista, durante o período do helenismo, surge Epicuro que funda uma escola em Atenas chamada de “O jardim”. Epicuro afirmava que não nos devemos preocupar com a morte, porque enquanto estamos vivos ela não veio e, quando morremos, já não estamos mais vivos. Ele até podia acreditar nos deuses, mas esses eram absolutamente felizes e não se preocupavam com a humanidade, não importando qualquer tipo de oração ou sacrifício para pedir uma intervenção divina no mundo mortal.
Tanto Epicuro como Demócrito acreditavam em uma força vital, extremamente forte, existente na natureza. Essa ideia de uma força vital aparece em Spinoza com a ideia de connatus. Spinoza afirmava que os seres humanos possuem dentro de si uma força vital natural, presente em toda a natureza, uma força que permite a pulsão da vida, o nascimento dos seres vivos.
Entendia que Deus era a própria natureza e, desta forma, nós não podemos acreditar em Deus, mas sim, conhecer Deus, e isso quer dizer que Deus se manifesta como uma totalidade (monismo) em todos os seres singulares, na vitalidade existente dentro de cada um.
Para Spinoza essa força vital faz a natureza se movimentar e existir.
Do ponto de vista ético, tal preceito permite analisar o ser humano em seus comportamentos sociais, como conhecedores ou não dessa força vital, e isso significa dizer que os humanos têm a possibilidade sempre de reverter a tristeza em alegria, de tal maneira que é só necessário permitir a manifestação de Deus, da própria natureza, a partir da noção de uma força vital dentre de cada um.
Para Spinoza tudo era determinação e a liberdade está em conhecer o que a natureza estipula para os humanos. Nós seremos livres se dissermos um “sim” para a vontade da natureza. Essa forma de pensamento reduz a importância da racionalidade como determinante de escolhas, conforme pode aparecer em Descartes. Não é o intelecto que comanda o ser humano, mas sim a força vital do desejo que pulsa em sua própria natureza.
Essa pulsão do desejo é mal vista pela tradição socrático-platônica, pelo cristianismo e pelo cartesianismo, pois consideram a verdade do corpo e da natureza como sacrílegas e heréticas. O objetivo dessa tradição é anular o que há de natural dentro e fora de nós, buscando um tipo de ascetismo, de puritanismo que afeta nossa vida em sua intensidade. A rendição aos princípios do mundo das ideias é a derrota frente a um projeto histórico-cultural que se assemelha a um tipo de assepsia e limpeza que não é possível atingir. Como resultado dessa tentativa temos a construção de um mundo racionalizado pela lógica do capital e da eficácia, burocratizado e administrado como são as empresas, onde os indivíduos são peças de uma grande engrenagem, a serviço de objetivos que não são deles e que, em última instância, não são nem dos detentores do capital, que são levados a práticas cotidianas visando a acumulação material em nome de uma felicidade impossível.
Essa prática histórica gera um processo neurótico, de alienação da realidade e de negação da força natural no interior de cada ser humano. Essa força interna é chamada por Schopenhauer de “Vontade”, uma força invisível que está presente em toda a natureza e que movimenta o universo e, com ele, a própria humanidade. Spinoza irá dizer que mesmo que o indivíduo pense que está agindo racionalmente, na verdade ele está sendo impulsionado pela força universal, esse Deus presente em todas as coisas. Porém, como o objetivo do racionalismo é o controle das emoções, ocorre que as motivações são racionalizadas e trancadas no inconsciente, impedidas de se manifestarem. O desespero que esse vazio existencial determina lota os templos religiosos de fanáticos que buscam por um Deus pessoal, capaz de interferir na vida cotidiana, que não existe.
Não adianta se ajoelhar e erguer as mãos para o céu, pois o céu não existe. Copérnico, há mais de 500 anos atrás, provou que a Terra não é o centro e que o que se pensa estar em cima é nada mais do que o Espaço, repleto de planetas, estrelas e galáxias. Como é bizarro ver alguém falando com o nada. É quase um exercício de loucura individual que, no contexto das religiões, torna-se loucura coletiva.
Em Nietzsche a questão da moral torna-se fundamental. O pensador alemão procura mostrar que a moral foi criada historicamente pela humanidade, a partir de instituições sociais como a religião ou o Estado, para condicionar a vontade de potência que deveria reger nossas atitudes enquanto seres humanos. A vontade de potência nietzschiana, presente no desejo de avançar perante a vida, de assumi-la plenamente em toda a sua dor e alegria, é o que nos faz sentirmos vivos e existentes. Negar a dor ou a alegria é uma forma de se encontrar morto em vida.
Nietzsche afirma que o homem é como uma corda, que se encontra entre o animal e o além do homem. O animal é a força vital em toda a sua pureza, da qual escapamos por meio do ego e da cultura, que Freud irá chamar de superego. Já o além do homem é alguém, se isso existe, que se desvinculou de toda a moralidade imposta pela sociedade e que cria suas próprias regras, com coragem e determinação, buscando dentro de si o que ele é de verdade, suas vontades e desejos, sem escrúpulos ou terrores.
Essa manifestação dionisíaca em uma sociedade repleta de imposições e castrações só pode ser exercida e exteriorizada por meio da arte, na sua capacidade criativa do novo, no seu desvendamento de instâncias de alegrias inimagináveis, de sonhos insuperáveis. O além do homem é algo pelo qual deveríamos procurar e alcançando, utilizarmos do que há de apolínio e, portanto, de belo, para marcar nossa presença no mundo.
Não se trata aqui de voltarmos ao estado natural selvagem, apesar de que não há nada no mundo que prove que tal estado não nos traria alegria e felicidade, pois em um mundo em que o que há de selvagem dentro de nós foi calado, a alegria e a felicidade parecem estar muito distantes. Trata-se, na verdade, de associar-se o dionisíaco, enquanto vontade de potência e negação da moralidade imposta ao apolínio, harmônico e belo, que se manifesta no ato da criação artística, e que se deverá manifestar em qualquer ato de criação. Desta forma iremos construir um mundo onde a liberdade não será mais um privilégio de poucos, mas uma realidade inerente a todo o ser humano. Um mundo onde a educação estará voltada para a imaginação e a criação, sem podas ou transferências, sem imposições coercitivas de toda ordem, onde a individualidade será respeitada porque, só haverá igualdade, no momento em que cada homem ou cada mulher falará com o outro do mesmo patamar, com os olhos nos olhos do outro.
Essa utopia que nasce com Spinoza, continua em Schopenhauer e Nietzsche, mas que possui outros defensores na contemporaneidade, assim como conheceu seus imaginadores na antiguidade grega e romana é, como toda a utopia, algo inalcançável mas, nem por isso, devemos negá-la. Deve servir de paradigma, de referência histórica para a busca de uma vida plena, mais livre e feliz.
Mas como venho escrevendo sempre, essa tal felicidade só pode ser encontrada no âmbito do possível, sem esperança e idealização. Como disse Sponville certa vez, é melhor uma verdade dolorosa do que uma felicidade idealizada.
Fiquemos com a realidade, tal como ela nos é sugerida pela vida, porque ela é a própria vida que não tem mais a nos oferecer do que a nossa própria existência. Desejar uma vida plenamente feliz só é possível no cemitério. Se alguém quiser ser realmente, na sua totalidade, feliz, deve se matar o mais rapidamente possível, porque viver é também compartilhar com os outros as dores e sofrimentos que a vida nos oferece sempre, temperada com pitadas de alegria que só serão ampliadas na medida em que nos dispusermos a retornar sempre, e repetir tudo de novo, em sua absoluta intensidade, afirmando e reafirmando a vida em sua plenitude, isto é, sabendo a dor e a delícia de ser o que se é.
segunda-feira, 23 de maio de 2011
A mediocridade da classe média
Basta ver o tanto de bobagens que se fala no Facebook, tipo "fui ao banheiro" |
NÃO SOU BEM RESOLVIDO, tenho muitos preconceitos. Um deles é contra a classe média.
Além disso, sou cheio de maus hábitos: charutos, cachimbos, álcool, comida com sangue e não ando de bike. Para mim, o vício e a culpa são o centro da vida moral.
Enfim, não sou uma pessoa muito saudável. Por isso, não sou de confiança. Mas não pense que sofro do fígado; sou apenas um fraco.
Tenho uma amiga, muito inteligente, que costuma me chamar de "flagelo da classe média".
Quando falo "classe média", não olhe para seu saldo bancário, olhe para dentro de si mesmo. Classe média é um estado de espírito, e não apenas uma "alíquota" do imposto de renda ou o tipo de cartão de crédito que você tem.
Uma das marcas da classe média é pensar que, quando se fala de classe média, pensa-se essencialmente em saldo bancário.
Você pode ter muita grana e pensar como classe média, quer ver? Vou dar um exemplo de um surto de classe média em alguém que não era da classe média.
O sociólogo húngaro radicado na Inglaterra Frank Furedi, em seu livro "Therapy Culture", comenta como a Lady Di (morta tragicamente em 1997), a "princesa da classe média inglesa" ou a "princesa do povo", lamentou para a mídia o fato de seu então marido, príncipe Charles (herdeiro do trono da Inglaterra), ter uma amante.
Podemos imaginar uma mulher do East End londrino se sentindo irmã da então princesa porque ambas sofreriam da mesma maldição: a infidelidade em um casamento infeliz. Choravam juntas, uma na frente da TV, outra na frente das câmeras.
Lady Di nunca entendeu o que é ser da aristocracia, confundiu-se com a classe média e seus anseios de que casamento, amor e felicidade sejam uma coisa só.
Mas não há muito o que fazer com relação à realeza hoje em dia, porque vivemos no mundo da opinião pública e "ter opinião sobre tudo" é um fetiche típico do espírito de classe média. Alexis de Tocqueville (1805-1859) já dizia que a democracia é tagarela.
Quando se depende da opinião pública já não há mais saída para escapar das "redes sociais" típicas do mundo contemporâneo, no qual as pessoas têm opinião sobre tudo a partir de seus apartamentos de dois quartos com lavabo.
Basta ver o tanto de bobagens que se fala no Facebook, tipo "fui ao banheiro" ou "vomitei". Além de "revoluções diferenciadas", as redes sociais potencializam a banalidade humana.
Quando a classe média sonha, ela sempre pensa como Cinderela. "Querer ser feliz" é coisa de classe média.
Você pode ser milionário e ter cabeça de classe média, por exemplo, quando faz algo preocupado com o que os outros vão pensar. Nada mais típico do espírito da classe média do que citar um restaurante numa ruazinha em Paris para mostrar que conhece a cidade.
Por outro lado, você pode ser uma pessoa que "batalha" pela vida e não pensar como Cinderela. Basta não criar de si mesmo uma imagem de "reduto do bem e da honestidade". O bom-mocismo social é o novo puritanismo hipócrita do início deste século.
Uma clara semelhança de espírito entre "aristocracia" e as classes sociais mais pobres (aparente absurdo) é a pouca ilusão com relação à hipocrisia social, substância da moral pública.
A primeira porque está acima da hipocrisia social (não precisa dela porque tem poder), e a segunda porque está abaixo da mesma hipocrisia social (não pode bancar a hipocrisia porque hipocrisia é um pequeno luxo).
O que caracteriza o espírito da classe média é pensar mais de si mesma do que ela é. Já que não tem nada, mas não morre de fome, fabrica de si mesma uma história de grandeza que não existe.
Por exemplo, inventa para si mesma uma "história de dignidade familiar", quando ninguém sobrevive sendo "digno", acha que educa bem seus filhos sempre "brilhantes", calcula cada proteína que come, num movimento de ganância travestido de preocupação com a vida, diz coisas como "não minto", quando, sabemos, a vida se afoga em mentiras necessárias à própria vida.
A classe média adora ter uma família de pobres como "amigos" para exibir por aí. Enfim, a classe média sofre de avareza espiritual.
domingo, 22 de maio de 2011
Exste vida após a morte?
Do ponto de vista científico, vida após a morte não faz sentido,embora a esperança de que ela exista seja muito compreensível |
Já que no domingo passado escrevi sobre o fim do mundo (era para ter sido ontem), é natural continuar nossa discussão refletindo sobre vida após a morte. especialmente nesta semana, quando o famoso físico Stephen Hawking falou do assunto em entrevista ao jornal inglês "The Guardian". "um conto de fadas para pessoas que têm medo do escuro", disse.
Mantendo a discussão ao nível "científico", o que podemos falar sobre experimentos que visam detectar vida após a morte?
eis o que escrevi sobre o tópico em meu livro "Criação Imperfeita": "quando ingressei no curso de física da PUC do Rio em1979, era a encarnação perfeita do cientista romântico, com barba, cachimbo e tudo.
Lembro-me, com um certo embaraço, do meu experimento para 'investigar a existência da alma'. Se a alma existia, pensei, tem que ter uma natureza ao menos em parte eletromagnética, de modo a poder animar o cérebro. e se eu convencesse um hospital a dar-me acesso a um paciente em coma, já prestes a morrer? Assim, poderia circundá lo com instrumentos capazes de detectar atividade eletromagnética.
Talvez pudesse detectar a cessação do desequilíbrio elétrico que caracteriza a vida [...] Por via das dúvidas, o paciente deveria também estar deitado sobre uma balança bem precisa, caso a alma tivesse peso." Continuo:"Na verdade,minha incursão no terreno da "teologia experimental" era mais brincadeira do que algo que levei a sério. Porem, minha metade vitoriana charlatã, devo dizer, tinha ao menos um predecessor.
em 1907, um certo Dr. Duncan MagDougall de Haverhill, em Massachusetts, conduziu uma série de experimentos para medir o peso da alma.emborasua metodologia fosse altamente duvidosa, seus resultados foram mencionados no prestigioso "New York Times":"Médico crê que alma tem peso", afirmou a manchete. O peso era em torno de 21,3 gramas, embora tenha havido algumas variações entre os poucos pacientes investigados. Como grupo de controle, ele pesou 15 cães, mostrando que eles não sofriam qualquer mudança de peso. O resultado não o surpreendeu, pois suspeitava que só humanos têm almas."
Os experimentos de Mag Dougall inspiraram o filme "21 Gramas", com Sean Penn fazendo o papel de um matemático à beira da morte.
De volta a Hawking, devo dizer que concordo com ele. Tudo o que sabemos sobre como a natureza opera indica que a vida é um fenômeno bioquímico emergente que tem um início e um fim.
Do ponto de vista científico, vida após a morte não faz sentido: existe a vida, um estado complexo da matéria em que um organismo interage ativamente com o ambiente, e existe a morte, um estado em que essas interações tornam-se passivas.
Morte é ausência de vida. (Mesmo o vírus só pode ser considerado0 vivo dentro de uma célula anfitriã.) É perfeitamente compreensível querer mais do que algumas décadas de vida, ter esperança de que existe algo mais.
Porém, nosso foco deve ser no aqui e no agora, e não no além. O que importa é o que fazemos coma vida que temos, curta que seja.Após ela, o que persiste são as memórias naqueles que continuam vivos.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro Criação Imperfeita
sábado, 23 de abril de 2011
"Whatever Works" ou tudo pode dar certo...
